BRASÍLIA - Sem previsão para deixar o Haiti, o Exército gastou,
de abril de 2004 a novembro deste ano, R$ 1,892 bilhão na manutenção da tropa no
país arrasado por uma guerra civil e, mais recentemente, por um terremoto.
Desse total, a Organização das Nações Unidas (ONU) reembolsou
R$ 556,5 milhões para o Tesouro Nacional. Os números são do Ministério da
Defesa. Na prática, um gasto de R$ 1,3 bilhão líquido em recursos do Brasil. Em
2004, o governo Lula justificou que a participação na missão de paz da ONU era
uma forma de garantir um assento permanente do Brasil no Conselho de Segurança,
o que não ocorreu.
Atualmente, o Brasil mantém 1.910 homens das Forças Armadas na
Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah). A maioria do
contingente brasileiro é do Exército. Ainda há militares da Aeronáutica (30
homens da Força Aérea Brasileira) e da Marinha (200 fuzileiros navais). A meta
para 2013 é reduzir o efetivo para 1.200 militares, mesmo número do início da
operação, em 2004 – o acréscimo ocorreu após o terremoto de 2010.
A redução da tropa de forma "responsável", nas palavras do
ministro da Defesa, Celso Amorim, é respaldada por uma resolução da ONU, de
outubro. No começo deste mês, o presidente do Haiti, Michel Martelly, escreveu
uma carta de duas páginas implorando à presidente Dilma Rousseff para negociar a
manutenção do efetivo, argumentando que ainda não conseguiu formar uma polícia
nacional para deter o avanço de gangues.
Em oito anos e meio, cerca de 25 mil militares brasileiros
passaram pelo Haiti. O governo avalia que a missão, embora não tenha garantido
um assento no Conselho de Segurança, derrubou uma das principais críticas ao
País no âmbito da ONU. Delegações estrangeiras sempre questionaram a
contundência dos discursos dos diplomatas do Itamaraty na área de direitos
humanos e a fraca presença real brasileira nos campos de conflito.
O gasto total do Brasil no Haiti é quase nove vezes maior que o
valor pedido em 2012 pelo governo de São Paulo ao governo federal para
modernizar as áreas de informação e inteligência da polícia – neste ano, o
governo paulista reclamou que pediu R$ 148,8 milhões ao Ministério da Justiça e
só recebeu R$ 4 milhões. No contra-ataque, o governo federal alegou que não
recebeu projeto consistente para o envio dos recursos. Se aplicada na área
social, a despesa no Haiti daria para pagar o plano de expansão da rede de
creches e escolas infantis nos próximos três anos e que, até agora, não saiu do
papel. O governo anunciou um investimento de R$ 1,3 bilhão até 2014.
Não estão incluídos no total de despesas os recursos gastos com
soldos dos militares. O gasto inclui recursos de diárias, alimentação,
comunicação, rede de internet, processamento de dados, explosivos e munições,
vestuário, transporte, combustível e produtos médicos e farmacêuticos.
Promessas. O projeto brasileiro no Haiti começou com festa.
Enquanto soldados chegavam a Porto Príncipe para montar base, a seleção liderada
por Ronaldo Fenômeno desfilava com a Copa Fifa em blindados da ONU pela capital
haitiana, diante de uma multidão eufórica, e aplicaria depois uma goleada de 6 a
0 no time da casa, para a festa dos ricos do país que tiveram acesso ao
estádio.
Enquanto tentavam se adaptar a um país sem infraestrutura, com
mais de 70% da população sem emprego, generais brasileiros pressionavam
diplomatas e autoridades para exigir recursos de organismos internacionais para
combater a miséria no Haiti. Em janeiro de 2010, o país caribenho foi atingido
por um terremoto, que deixou 316 mil mortos, segundo o governo haitiano. A tropa
brasileira também foi atingida, com a morte de 18 militares.
Dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi)
indicam que o governo gastou, em 2011 e 2012, R$ 235 mil em bolsas para os
filhos dos militares mortos no terremoto. A tragédia de 2010 tornou ainda mais
dramática a vida que já era praticamente insuportável no país. Sem árvores –
cortadas para lenha de fogão –, as ruas de Porto Príncipe ainda estão tomadas de
abrigos improvisados de sobreviventes do terremoto.
Os discursos de dirigentes da ONU pedindo recursos
"impactantes" para o Haiti não mobilizaram a comunidade internacional, antes ou
depois do começo da crise financeira de 2008. O governo brasileiro deve
endurecer, no próximo ano, o discurso contra a própria ONU.
O Ministério da Defesa e o Itamaraty reclamam que o Brasil se
comprometeu a gastar US$ 40 milhões, por exemplo, na construção de uma
hidrelétrica com capacidade de 32 megawatts no Rio Artibonite, ao sul de Porto
Príncipe, e, até agora, os demais países não repassaram um centavo para o
projeto orçado em US$ 190 milhões e que beneficiará 1 milhão de
pessoas.
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